Almada Negreiros - E o prazer momentâneo da unanimidade

Futebol e Modernismo andaram sempre de costas voltadas, mas nem por isso deixaram de entrar de mãos dadas no Séc.XX. Os escritores e pintores intelectuais da época, desde Pessoa a Aquilino Ribeiro, passando pelo próprio Almada Negreiros, não aceitavam o futebol como algo produtivo, e recusavam-se a dar-lhe mais importância do que a que lhe davam os estudantes de ciências, mais ligados ao culto do físico.
Parodiava-se até, por entre os mais letrados da época, que se perguntassem por Almada Negreiros a um adepto de futebol, ele diria Almada 1- Negreiros 0.

Aquilino chegou até a escrever:

"O futebol vai-se tornando o mane-tecel-pares de uma população de impaludados, de sifilíticos e alcoólicos na sua maioria. À geração que vai escalar o mando familiar chamou o Dr. Agostinho de Campos "geração do pontapé na bola".
Com este designativo entrará na história, reles, analfabeta, sem curiosidades de inteligência nem uma directriz moral.Como se pôde enraizar entre nós um desporto tão contrário ao nosso habitat e aos nossos costumes? Como pôde congraçar no seu culto desde o menino que começa a gatinhar, ao ginja de cabelos brancos, para quem esperar toiros, ver correr toiros, era um pratinho sem rival?De todos os jogos é sem dúvida este o mais estúpido e inconsequente. O remo fortalece o remador e tonifica-lhe os pulmões; o jogo de pau adestra o jogador para a defesa do respeitável costelado; o tiro é um passatempo nobre; a gineta é saudável e elegante; o ténis ensina as belas atitudes; até o boxe e o savate preparam o homem para esmurrar um patife que se lhe pranta pela frente ou quando pretenda lavrar uma desafronta.Mas o futebol, que acréscimo de força ou de beleza traz a quem o pratica?

(Aquilino Ribeiro,"Crónica da Quinzena" in "A Ilustração" de 16-VII-1926)"

Mas a verdade é que, com o passar dos anos, o Futebol tornou-se parte de Portugal, e se havia algo que movia os intelectuais do início do Século, era a nacionalidade, o patriotismo, a Portugalidade. E foi aí que entrou o Benfica.

Com o espalhar do nome português por toda a Europa, o Benfica ajudou o desporto 'futebol' a ser reconhecido pelos intelectuais da segunda metade do século, apanhando ainda o grande Mestre Almada Negreiros, pouco antes de nos deixar.
Porque consta que, no leito da morte, o Mestre Almada perguntou quanto tinha ficado o Benfica. Quem estava do seu lado perguntou-lhe que importância isso tinha naquele momento, com o Mestre prestes a morrer. Almada respondeu-lhe que a ignorância, seja no que for, não traz conforto a ninguém.
Admirador da vertente unificadora que Salazar havia construído para promover a nacionalidade, sem ser adepto da censura imposta, para um Almada Negreiros em final de vida era bastante importante que existisse unanimidade entre o povo, para que se pudesse entrar numa era de prosperidade. E isso também significava saber quanto ficou o Benfica.



Neste momento, e agora falando no Benfica actual, temos algo que já não tínhamos desde 2010. Unanimidade. É tão bom não termos quezílias  entre sócios, entre a direcção, entre treinadores. Esta caminhada gloriosa que os nossos meninos têm feito, fez muito pela nação Benfiquista, que já se ama, sente e vê, sem qualquer tipo de preconceito ou parvoíce. Espera-se novos tempos, tempos de modernidade, com um Benfica forte, seguro e capaz de encantar a Europa com os seus novos pensadores contemporâneos.