"JÁ VOS CONTEI DAQUELA VEZ...

...que trabalhei no sector de investigação privada?

Tinha um escritório no Centro do Rio, onde fazia uns trabalhos extra ao fim de semana, mas normalmente estava sempre às moscas. Não é que não houvesse trabalho, eu é que não aceitava todos os casos. Sábado de manhã entra uma loira de 1,80m (daquelas de parar o trânsito de tão boa que era) pela sala adentro e dispara:

- Quero que você descubra o meu bikini!

Apaguei de imediato o meu cigarro, recém acesso, e mexi no telefone para parecer ocupado.

- Ok. Será um prazer, tanto para si como para mim. Mas vamos tornar isto um pouco mais pessoal. Bom dia, chamo-me B. E você é...? - perante tal cenário nem quis saber como é que ela chegou até mim.

- Muito gosto em conhecê-lo, sou a Paloma. Mas o que eu queria mesmo era que você encontrasse o meu bikini dourado. Desapareceu lá de casa ontem.

Meti a mão na gaveta da mesa e saquei um cigarro do maço. Acendi-o.

- Desculpe se a pergunta parece ridícula, mas... já procurou nas gavetas?

- Se você acha que eu ainda não procurei nesses locais, talvez eu esteja enganada e você não seja o homem que eu procuro...

- Tinha de perguntar. Faz parte do ofício. E não, você não se enganou. Sou o homem que procura. (Com o corpo que ela tinha, eu lá era homem de recusar o trabalho.) Voltando ao assunto que a trouxe aqui, onde viu o bikini pela última vez? 

- Nas mãos da minha irmã mais nova, enquanto experimentava outros bikinis. Não consigo falar com ela pelo telefone. Safada! Aposto que foi essa piranha que levou o meu bikini.

- Sabe onde ela costuma estar nesse horário? E de que tamanho é o bikini? (Uma vez sacana, sempre sacana. Vocês sabem do que estou a falar, sacanas!)

- Minúsculo, disse ela.

Dei o gole longo no meu suco de laranja - Paulo Futre style.

- A piranha deve estar na praia, curtindo com os amigos, continuou.

-Deixe comigo. Vou dando notícias.

Uma investigação destas pedia roupas apropriadas à ocasião. Depois de meia-hora num pronto--a-vestir, saí de lá vestido para executar a tarefa. T'shirt colorida, calções de banho, chinelo tipo "havaianas", chapéu de palha, e a minha gabardina de sempre. Gabardine, porque o trabalho exigia discrição. Fui para a praia.

Entrei pela praia adentro e comecei descalço a percorrer as areia tórridas. A praia estava cheia de gente. Vai ser dificil encontrar aquele bikiki. Provavelmente está enterrado numa dessas bundas que parecem pertencer a um gnu, pensei. Com tanto cu de gaja, mesmo que não encontre a porra do bikini, pelo menos não perco a viagem. Uma espécie de tackle à Mozer - já que o iniciei, deixa cá varrer tudo o que está pelo caminho.

Mas a meio da praia de Ipanema, lá estava ela. Uma entre várias. De todas, uma. Havia-as de todos os países, de todos os clubes cariocas, de todos os clubes brasileiros. Bem ao alto, e a cumprir o seu destino de esvoaçar mais bonita que todas as outras - a bandeira vermelha do Sport Lisboa e Benfica. Saquei a câmara fotográfica que estava no bolso da  gabardina e eternizei o momento. Eternizei para os outros. A mim, bastava-me o que os meus olhos viam. Mas nesta profissão, somos as provas que temos. Aproximei-me da barraca que ostentava a mais bela de todas e fiquei por ali a tarde toda. Senti que estava em casa - os meus irmão estavam lá todos. O território bravo por explorar, era, de repente, um lugar que eu sempre conheci.

Pela noite estava de regresso ao escritório (já vos disse que também era ali que dormia? Aquele sofá estava a acabar com a minha coluna...). Peguei no telefone e liguei para a Paloma. 
-Alô, Paloma? Sim, sou eu. Não, não encontrei o seu bikini nem a sua irmã. No fundo é só para lhe dizer que tive uma epifania. Vou mudar de vida e de lugar. Pretendo passar os meus fins-de-semana ao sol na praia, em Ipanema, ao lado da família. Portanto, não volte a procurar-me nem a chatear-me com coisas menores. Passe bem. E desliguei."


Texto e Imagem enviados pelo nosso correspondente no Rio, Señor B.